O encontro entre a moda e a música
por jessicabalbino - 17/09/2012
zona sul | MG
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Literatura marginal inspira coleção de camisetas da grife Criolê
“A cada cem prédios construídos, uma árvore plantada. De cem pessoas no presídio, uma sai recuperada”. A frase citada é do músico, poeta e educador Renan Inquérito e está no livro#PoucasPalavras. Mas, recentemente, ganhou vida e novas cores, ao integrar a nova coleção da grife Criolê, que lançou uma linha de roupas inspirada na literatura marginal e escolheu frases da obra para, literalmente, abrir os trabalhos no terreiro “Ponto de Cultura Caminhos”.
O Emporio do Acarajé – Flor do Dendê, na cidade de Hortolândia (SP), com a decoração ambientada na África, com as paredes, vitrines, quadro e música em sintonia foi palco para o desfile da grife, que fabrica roupas artesanais a partir de iniciativas sustentáveis, sempre pautada na economia solidária, baseada na dinâmica de renovação cultural e de continuidade.
A ideia de transformar as poesias em algo ainda mais visual surgiu após uma oficina ministrada no encontro“Hip-Hop no Terreiro”. “Neste evento, a literatura marginal foi representada com frases do livro #PoucasPalavras e então surgiu a inspiração da grife para fazer as roupas”, conta Renan Inquérito.
A junção deu certo. No desfile, realizado sem passarela e no mesmo plano que os convidados, os modelos foram os próprios jovens da comunidade, que frequentam o ponto de cultura.
A Miss Beleza Negra de Hortolândia 2011 e 2012, Victoria Vitor e Iuli Caroline também foram convidadas para o desfile, o que, para ela, foi um grande prazer por mesclar etnia, cultura e literatura. “As poesias nas camisetas são uma forma de chamar a atenção da nossa população, que não dá valor a esse tipo de arte. É um protesto mesmo. Pequenas frases mega realistas, personalizadas por uma arte belíssima que é a Criolê. A fusão entre a poesia do Renan Inquérito e a grife foi perfeito, porque são duas coisas que tem muito em comum. Uma combinação que tenho certeza que será um sucesso”, afirma.
Ponto para Renan Inquérito e para a literatura. “Se a literatura marginal quebra os padrões do que é literatura, esse desfile também quebra os padrões de beleza e de estética do que vem a ser moda”, acredita.
Amigas lançam parceria e figurinos sustentáveis em eventos de hip-hop
Graffiti, plástico, lâmpadas e beleza. Sutil e inusitado, assim é o modelo criado pela estilista Lorena Santos, conhecida como Lolita, que há 13 anos trabalha com moda e veste a MC Zaika dos Santos. Numa parceira, as amigas lançam figurinos durante eventos. Engana-se quem pensa que esta é apenas mais uma “moda” dentro da cultura hip-hop. As roupas vão além de uma simples composição de cores e peças. Tratam-se de figurinos sustentáveis, ou seja, que chamam atenção para o meio ambiente. “Eu acho que essa é a ideia. As mulheres tem que se fortalecer com essa linguagem de união”, afirma Zaika.
Assim, surgiu o primeiro figurino, que foi apresentado no Palco Roots, de uma festa no Multishow. Depois disso, coisas mais ousadas surgiram nas peças, unindo o conceito sonoro do hip-hop, numa linguagem própria política e na identidade visual da roupa, também discutindo políticas. “Isso deu uma linguagem muito única para o trabalho. Quando vou me apresentar em algum lugar, já rola uma expectativa do que está sendo preparado”, conta.
Um exemplo disso foi durante a primeira etapa deste ano do Palco Hip-Hop, quando Zaika foi apresentadora do evento no Sesc Palladium em Belo Horizonte (MG) e vestiu um figurino que além de um apelo sustentável, homenageou o graffiteiro Amigo, morto há um anos.“Ele tem um símbolo muito forte porque é ligado ao querido graffiteiro Amigo, porque ele faleceu e é uma das maiores referências mineiras. Temos um respeito muito grande pelo trabalho dele e o conceito todo se baseia na linguagem e homenageá-lo”, emociona-se.
Formada em moda, Lorena criou a marca Lolita Az Avessas e por frequentar desde 2003 o cenário da cultura hip-hop resolveu unir o trabalho à questão comportamental. “Sempre existiu em mim essa vontade de trabalhar o comportamental. É algo que eu gosto muito, tanto no hip-hop como na moda”, enfatiza.
Daí, não demorou muito até que Lorena sugerisse à Zaika um trabalho a partir do material bruto para os figurinos e a questão da sustentabilidade surgiu em meio às roupas. “É um tema bastante latente e até acho que já é uma questão de educação. É claro que não vai ser de uma hora para outra, mas temos que dar esses passos para sermos um cidadão melhor e quando temos a possibilidade de falar sobre isso visualmente, através de um artista, de uma cantora, a mensagem chega mais rápida”, enfatiza.
Questionada sobre a concepção dos figurinos, Lolita explica que cada um deles é especial e oferecem oportunidades diferentes de trabalho. “O que a Zaika veste agora, no Palco Hip-Hop é muito bacana, porque eu tive oportunidade, através da moda de homenagear o graffiteiro Amigo, que é ímpar no hip-hop. A criação foi há um mês. Eu fiz a peça e senti a necessidade de trazer isso e agregar mais valores. Aproveitamos eventos de grande repercussão e homenagear essas pessoas que transitam entre nós. Temos que mostrar estes talentos e fico feliz de a moda me dar essa oportunidade, de potencializar nossos talentos dentro da cultura”, salienta.
Ponto para ela, quando arranca comentários como. “Eu vestiria uma peça como a da Zaika. Achei incrível a composição de cores e elementos. Chama muita atenção e remete, automaticamente, ao hip-hop e ao meio ambiente”, dispara a estudante Larissa Antunes, que acompanhou o evento e viu, de perto, o figurino lançado na ocasião.
IMAGENS
Renan Inquérito declama poesias do livro #PoucasPalavras durante lançamento da coleção - foto: Márcio Salata
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